É com tristeza que recebi na terça o parecer final do Conselho de Justificação, processo demissional a que estou sendo submetida. Decidiram que sou culpada de não ter sido promovida (sim, é isso mesmo!) por não reunir condições médicas e clínicas para promoção, alegação que foi refutada várias vezes e com clareza no desenrolar do processo, que incluiu uma avaliação da Junta Médica da Corporação. Em termos práticos, é sugerido que eu seja aposentada compulsoriamente.

Após 26 anos de serviço, este momento é o mais doloroso que já enfrentei. Todo esse tempo, eu não soube do que estava sendo acusada e permaneço sem saber. Não há explicação. A suposta razão não tem lastro legal e não se sustenta com as provas. Não querem apontar o real motivo. Mas sabemos qual é a motivação. Só não foi dito em nenhum momento.

Deveria ser um princípio básico que todos tenham igualdade de oportunidades e respeito, independentemente de sua identidade ou orientação sexual. É inaceitável que eu esteja sendo punida simplesmente pela existência travesti e pelo desconforto que minha presença possa gerar.

Sempre refleti sobre as violações recentes dos direitos humanos e me perguntei como essas situações atrozes chegaram a ocorrer. Quantas pessoas envolvidas tiveram que dar o seu aval para que tais atrocidades se concretizassem? Quantas consciências se calaram e abandonaram sua humanidade para apoiar atos tão desumanos? Jamais imaginei que seria uma dessas pessoas.

Neste momento de tristeza e indignação, encontro conforto nas que me antecederam e nas que ainda virão. E na esperança de que a justiça prevaleça. Mesmo que tardia, ainda acredito na sua realização.

Este não é o ponto final desta jornada. A decisão proferida pelo Conselho de Justificação continua sujeita à confirmação do Governador e, posteriormente, à revisão por um colegiado do Tribunal de Justiça.

Continuaremos a lutar. Apesar das adversidades, estamos longe do fim desta batalha.

Imagem: MEYER. Henry. “Le traître : Dégradation d’Alfred Dreyfus”. 1895, França

#ParaTodosVerem O desenho mostra o Capitão Dreyfus, já sem suas divisas, em frente a um pelotão de militares, vendo sua espada ser partida por outro oficial.